Como dominar um país subdesenvolvido sem precisar de uma guerra, só na base da ideologia
Faça seu povo odiar a política. A política resolve nada, é só corrupção, esqueça isso. A virtude está no mercado, que é impessoal e entrega o que vc quer.
Tenha domínio sobre sua grande mídia. Como fazer isso? Simples, basta entregá-la para a burguesia local alinhada aos interesses das grandes potências capitalistas, como os EUA fizeram com a Globo via Time Warner.
Use essa mídia para repetir 24 horas o mantra de que política é corrupção, políticos, principalmente de esquerda, são demagogos e populistas, e que a virtude está no mercado.
Use essa mídia para dizer que quem provoca a desigualdade e a pobreza é o funcionalismo público e as políticas “intervencionistas” do Estado. Vc é pobre porque vc paga via imposto a fortuna de R$ 3000,00 como salário para o seu Zé que trabalha no almoxarifado do fórum da esquina. Vc não pode fazer universidade porque as unis públicas só querem saber de aluno “riquinho”. Vc não pode comprar playstation barato por culpa da política econômica do Estado.
Use a mídia para dizer que tudo o que é do Estado não presta e só dá gasto, para assim a população concordar com a entrega das riquezas nacionais, como petróleo, infraestruturas de energia e transporte, investimento em pesquisa e desenvolvimento, estatais estratégicas, principalmente as que fomentam complexidade (caso mais recente: EMBRAER), enfim, para que a maior corrupção de todas, o roubo de tudo aquilo em que está o desenvolvimento e o futuro como algo bom e necessário.
Use a mídia para engrandecer e glorificar o “agronegócio”, para assim condenar o país a uma economia primária, para que nunca desenvolva sua indústria e nunca se torne um concorrente dos produtos industrializados dos países centrais,ameaçando assim sua hegemonia. Sim, o capitalismo é um jogo de soma zero e se os países periféricos ganharem complexidade, os países centrais perdem. O sucesso dos 20 países capitalistas centrais depende totalmente do fracasso dos 180 países capitalistas periféricos.
Invisibilize os ricos dizendo que os ricos são os funcionários públicos e a classe média. Para tal, use a mediana de renda, que em país pobre rebaixa a linha da pobreza a tal ponto que até um lixeiro assalariado é considerado rico. Assim, os reais ricos ficarão livres de críticas, afinal, eles não existem! o que existe é uma classe média e funcionários públicos privilegiados. Desta forma, a necessidade da tributação progressiva e taxação das grandes fortunas fica invalidada e a extrema desigualdade, um dos fatores que possibilitam a colonização moderna, se mantem.
Mantenha sua população na ignorância, não permita que desenvolva senso crítico, no máximo deve receber uma educação voltada para os interesses do mercado. Uma população ignorante é mais vulnerável a acreditar no mantra de que política é o mal e o mercado é o bem. A pobreza, por sua vez, não só traz carência material, mas sobretudo emocional, tornando as pessoas vulneráveis aos exploradores da fé. Estes, por sua vez, naturalizam o status quo, demonizam os progressistas e desenvolvimentistas e fortalecem o conservadorismo moral, paralisando a sociedade.
Fomente o complexo de vira-lata, o individualismo e a meritocracia. Nos países subdesenvolvidos, isso possui um efeito mais efetivo do que 10 mil bombas atômicas, pois destrói qualquer possibilidade de união, pertencimento, de coesão, de real nacionalismo, muito pelo contrário, fomenta um ambiente de extrema competitividade, de hostilidade, de ódio mútuo, minando qualquer possibilidade do surgimento da cidadania e de um caráter nacional, para assim facilitar o saque do país pelos interesses estrangeiros.
Treine a “justiça” desses países para que criminalize qualquer político, seja de direita ou de esquerda, que ousar orientar seu país para uma direção menos subalterna em relação aos países centrais, que acredite no potencial do seu país e do seu povo, que sabe que entre o capitalismo de Estado “intervencionista” que explora o conhecimento e o capitalismo liberal que explora matéria-prima, apenas o primeiro traz real desenvolvimento. Quando um país periférico tentar copiar o modelo de desenvolvimento que os países ricos usaram, use a justiça local para dizer que isso é corrupção e criminalizar a política.
Crie think tanks neoliberais e ultraliberais para imbecilizar a classe média e para fortalecerem o mito de que os 20 países centrais do capitalismo se desenvolveram com “livre mercado”, escondendo a real receita do bolo: o uso do Estado para proteger a economia, criar infraestrutura, investir em ciência e tecnologia, sendo o mercado apenas um coadjuvante, que se aproveita do desenvolvimento planejado politicamente.
Este é o manual básico de como manter suas colônias em pleno século XXI, que ainda vai ter eficácia por muito tempo entre um povo que odeia mais um funcionário público do que o patrão que o explora, que odeia mais um comediante do que o pastor que o rouba, que odeia mais um sindicalista do que o banqueiro que o estupra na base de taxas e juros.
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