8 de Março

Por Adalberto Monteiro[*]

Enquanto escrevo, mulheres iguais a ti acordaram mais cedo. Talvez com aquela ansiedade que antecede as batalhas nem tenham tido tempo ou paciência para passar manteiga no pão ou batom nos lábios.



Andam apressadas, correm, “coração disparado”, pois hoje é o 8 de março. Para que este 8 de março novamente houvesse quanto trabalho foi preciso! Gerações e gerações mantiveram a jornada pela emancipação das mulheres. O mundo mudou bastante, muitos foram os avanços, mas ele permanece velho e arcaico. Persistem as iniquidades do capitalismo, e as mulheres – apesar das conquistas – seguem vítimas de atrocidades e preconceitos.

Desde que assinei a ficha de integrante do contingente de construção do mundo novo, passei a conhecer essas mulheres iguais a ti que – de um elevado de um teatro, ou de cima de uma cadeira ou de um caminhão, ou às vezes mais altas tão somente pelo salto alto das sandálias – argumentam com paciência, ou a impaciência de quem é alvo da surdez da sociedade (e muitas vezes dos(as) próprios(as) companheiros(as) e camaradas); nos sacodem com voz doce ou estridente; enfim, nos apresentam a verdade de que não haverá mundo novo se as mulheres continuarem vítimas de violências, preconceitos e discriminações.

Essas mulheres iguais a ti nos dizem que, sim, libertar o proletariado e a humanidade da opressão de classe com certeza é uma grande e bela obra. Mas essas guerreiras e princesas do porvir, essas mulheres iguais a ti, nos dizem que, todavia, nada será realmente belo se as mulheres continuarem sendo tratadas como na época das cavernas.

Em Goiânia, conheci um “abrigo de mulheres”, muros altos, soldados à porta, refugiadas com a prole à volta, privadas da liberdade, foragidas da violência de seus maridos, espancadas, queimadas, ali exiladas, pois se retornassem ao lar seriam vítimas de uma violência ainda maior.

Há uma gravura de um artista plástico judeu, Gershon Knispel, que retrata Olga Benário Prestes nos campos de concentração da Alemanha. Está altiva, mas pálida e triste… Dá vontade de pular para dentro da gravura para libertá-la, para que amamente Anita, para que alimente a luta.

Olga, bela, brava, culta, nos olhos o verde manso e doce das folhas de cana. O nazismo a considerava uma ameaçava. Ela atravessou o Atlântico a mando do amor e da luta de classes, mas a Gestapo tinha garras longas.

Nem a largura do oceano foi o bastante para protegê-la. Foi entregue grávida à ditadura de Hitler para perecer num campo de concentração nazista. Esse talvez seja o crime que mais bem simbolize a violência política do Estado Novo.

Quantas Olgas estão adormecidas em nossas milhões de Marias? Um mundo novo, de fato, só poderá ser edificado se as mãos sensíveis e mágicas dessas milhões de Marias despertadas participarem de sua conquista e construção.


Jornalista e poeta é presidente da Fundação Maurício Grabois

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