BRASIL: eleições municipais e máquinas partidárias

Arrigo Cervetto sintetiza. A dialética da centralização política que caracteriza a democracia como melhor invólucro político de um Estado imperialista: “ A democracia imperialista é por um lado, o centralismo de poucos grandes grupos econômicos e, por outro lado, o pluralismo de suas vontades políticas condicionadas pela dinâmica de seus interesses. A democracia imperialista é, portanto, o centralismo pluralista do grande capital”.

Uma dinâmica que se manifesta em todos níveis das relações entre correntes políticas e frações da burguesia.

Por Zedotoko Costa*

A máquina partidária como expressão do capital

A força adquirida pelo PT nos últimos anos, com tres mandatos consecutivos na Presidência, aliados a um crescente número de prefeituras conquistadas, fazem do partido uma expressão clara e peça fundamental na “centralização pluralista do grande capital”.
Reportagem do “Valor Econômico”, de 28/05/2012, mostrava como o partido teve em 2011 uma receita extraordinária, de R$ 109,9 milhões, 145% a mais do que 2009, e 147% a mais do que a segunda maior receita partidária, do PMDB (R$ 44,5 milhões); o terceiro em receita o PSDB, teve R$ 38,5 milhões. Com uma dívida de R$ 53,9 milhões o PT foi a caça dos tradicionais doadores para tentar quitar suas dívidas e, segundo o jornal, “entrar na eleição municipal deste ano com um caixa mais folgado”.
O PT arrecadou 89,5% do que foi doado por empresas a 29 partidos no ano passado. Foram R$ 48,9 milhões que o partido recebeu da iniciativa privada, dos quais 45% foram contribuições de empreiteiras, sendo a Andrade Gutierrez a principal doadora (R$ 4,6 milhões). Em segundo lugar, figuram fornecedoras de serviços e equipamentos para a Petrobras (10,8% das doações), em terceiro, empresas ligadas ao agronegócio (10,3% das doações), seguidas pelo setor petroquímico, que doou o equivalente a 9,9% do arrecadado, sendo a Brasken sozinha responsável por R$ 4 milhões. O setor financeiro, naturalmente, não fica de fora, com Bradesco e BMG, respondendo por 7,9% do arrecadado. Para se ter uma noção da dimensão das contribuições, o PMDB eu PSDB receberam bem menos, respectivamente ficaram com 5,2% e 4,3% do total das contribuições das empresas.
E mais, como demonstração de como o capital é internacional, “a cingapuriana Jurong shipyard nem começou a construir seu estaleiro em Aracruz, no ES, mas já deu r$ 1 milhão para o PT”. Para não termos dúvida, a arrecadação vinda de pessoas físicas equivalem a 1,5% do total, sendo que o percentual seria ainda menor se não fossem as contribuições feitas grandes empresários: “Jose Celso Gontijo, que é investigado no mensalão do DEM e deu R$ 600 mil; Ronaldo de Carvalho, que é um dos donos da Drogaria São Paulo e contribuiu com R$ 100 mil; e Benjamin Nazário Fernandes F., acionista da Benafer, uma das maiores distribuidoras de aço plano do país”.
Capacidade de penetração local para projeção nacional
É uma indicação clara da força da máquina petista nas eleições municipais e a potencialidade em cooptar partidos e se oferecer ao grande capital com uma coalizão em 2014 para reeleger Dilma.
No processo de centralização política que ocorre em nível municipal , ou mesmo estadual, a dinâmica não é diferente da dialética da centralização pluralista, mas não está diretamente atrelada aos desafios estratégicos que precisam ser centralizados pelo Estado imperialista, dado que, ainda que os monopólios tenham “função decisiva” na economia, muitas das vezes os interesses locais e regionais refletem correlações de forças específicas. É a localização territorial dos interesses da burguesia, dado seu inevitável fracionamento enquanto classe.
Para o cientista político Carlos Alberto de Almeida “qualquer eleição em qualquer município brasileiro, serão regidas pelos problemas mais imediatos que afetam o eleitor, serão eleições inteiramente locais. Contudo, os resultados terão impacto na política nacional” porque vão influenciar a composição das forças para 2014.
O cientista político e professor da UFF, Renato Lessa, é uma “eleição forçosamente local. […] Eleições locais possuem sua gravitação particular. Ocorre uma uma dinâmica política local que ainda que detenha ligações com o resto do sistema , tem sua lógica própria […] . Em eleições locais de grandes centros, vemos envolvidos todas as dimensões do sistema político”.
Para a colunista do “Valor” (26/10), Maria Cristina Fernandes, “são fartas as evidencias de que o eleitor da disputa municipal não se subordina às estratégias eleitorais das lideranças partidárias […] O que as eleições municipais revelam é a estruturação das máquinas partidárias para conquista do voto” .
Ainda que a centralização do executivo em nível federal, no Brasil, não reflita diretamente as coalizões em níveis municipal e estadual, estas, ao contrário são fundamentais para a composição e sustentação de forças para as disputas estaduais e nacional.
PT e PSB, os mais fortalecidos
No entanto, nesse cenário o PT e o PSB se prefiguraram como forças fundamentais de luta em nível nacional. Por exemplo, o crescimento do PT, nos grotões do país e em São Paulo; uma projeção do PSB mais ao sul, ainda que se mantenha um partido fundamental do Nordeste.
Entre os partidos de grande porte, PT e PSB foram os que mais cresceram em números de municípios e de população sob sua administração. Em termos de prefeituras conquistadas, o primeiro aumentou em 14,8% , vitorioso em cidades importantes administrará um contingente populacional de 37,1 milhões de habitantes, um crescimento de 25%. Dentre os 83 municípios com mais de 200 mil eleitores, o PT caiu de 26% para 19,3%, mas em compensação levou São Paulo, o maior colégio eleitoral do país e maior orçamento municipal sob sua administração, que sozinho representa 41,6% dos R$ 77,6 bilhões de orçamentos que o partido irá governar. O caixa da cidade responde por 22,7% dos orçamentos das 5568 cidades do país.
Mas um fato cama atenção. Desde a abertura política no país , é a primeira vez que um prefeito é eleito em São Paulo apoiado pelo presidente da república. Com isso, além do próprio partido, em nível nacional Lula sai fortalecido principalmente dentro do PT, como elo de unidade nas disputas internas de suas correntes. Marta Suplicy, além do cargo obtido como ministra da Cultura, teve que reconhecer que “Lula tem a maior intuição, o maior tirocínio político que este país viu em muito tempo” (“Folha S.P.” 29/10).
Por sua vez, o PSB deu passos proporcionalmente ainda maiores, com um incremento de 42,6% no número de prefeituras. Além disso, desde a redemocratização, pela primeira vez um partido fora dos tres grandes – PT, PSDB e PMDB – obteve a maior quantidade de capitais. O PSB conquistou 5 delas, enquanto PSDB e PT ficaram com 4 cada um e o PMDB com duas. Sua participação no G8 também deu um salto significativo, o partido passou de 5,2% para 13,3% de administrações que governará nesse grupo. Assim, também aumentam os orçamentos sob seu comando, que dobra de tamanho , pulando para 11,1% do total dos orçamentos municipais.
Na estratégia reformista do grande capital, um partido baseado no Nordeste, o PSB, tenta ganhar projeção nacional, exatamente partindo das áreas de maior desenvolvimento econômico do país. Campos ganha força para negociar alianças e sua candidatura em 2018, ou possivelmente até em 2014, ainda que com resistências internas dos Ferreira Gomes , fortes no Ceará.
Oposição ainda com dificuldades
A oposição, por sua vez, perde mais espaço, mesmo que com movimentos contraditórios. Se, na opinião do professor de filosofia da USP, Vladimir Safatle, “a oposição hoje se resume a um só partido, o PSDB” (“Carta Capital”, 17/10), ainda que este tenha perdido em número de prefeituras – e o serrismo tenha sofrido forte derrota em São Paulo -, por outro lado, conseguiu uma sobrevida no Amazonas, com a vitória de Artur Virgílio em Manaus – única das 62 prefeituras de estado – e do Nordeste, entrando em alguns currais eleitorais do PT. Mas no RJ o partido continua patinando, com apenas 2,2% das prefeituras.
Estas eleições deixaram caminho livre para Aécio Neves construir uma referencia nacional para além de Minas. Aécio se cacifa a liderança unificadora do partido em nível nacional, com a derrota de Serra. O PSDB paulista, por sua vez, não tem outro nome viável, a não ser que Alckmin consiga construir uma referencia nacional, o que não tende a ser sua movimentação, dada a possibilidade de disputar a reeleição para o Estado de S. P.
Contudo, já apontávamos que forças e formas do reformismo estavam mudando nesta rápida fase de crescimento imperialista do Brasil. O G4 político (PMDB,PSDB,PT e DEM) apontado por nós se configura e se complica ainda mais. O DEM consolida seu declínio, mas ganha sobrevida com a vitória de ACM Neto em Salvador.
De qualquer forma não está descartada uma fusão entre PSDB, DEM e PPS, o que daria ao partido uma musculatura tanto no Congresso quanto nas disputas estaduais e municipais. Uma possível fusão criaria um partido com potencial de chegar a ter a maior bancada da Câmara, o primeiro em número de prefeituras, em torno de 1099, e cerca de 37,9 milhões de habitantes sob sua administração.
Temos que acompanhar os desdobramentos e as batalhas entre os partidos e entre suas correntes internas. PSB e PSDB ou PSB e PT são portas abertas por Campos para negociar sua projeção em nível nacional.


*Colaborador
   Fonte : Lotta Comunista/Intervençao Comunista

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